O café e um bilhete
Olhou-se no espelho, retocou o eyeliner, guardou os apetrechos na bolsa e deixou o banheiro. Lentamente, caminhou até sua mesa, desviando dos garçons com bandejas de prata. No espaço reservado a fumantes, os assentos tinham espaldares altos e lustres individuais em cima das mesas, tornando o lugar atrativo aos casais.
Ela bebeu do vinho e comeu seu macarrão ao pesto, enquanto ouvia o homem, na sua frente, falar. Nada muito interessante, só a mesma ladainha dos primeiros encontros com alguém novo. Filmes e discos favoritos, uma conversa superficial sobre trabalho, outra mais aprofundada sobre as viagens inesquecíveis e muitos sorrisos.
Ela sorria de volta, tecendo comentários esporádicos sobre seu prato e suas viagens. Respondeu às perguntas dele e fez algumas também. Mexeu no cabelo, cruzou e descruzou as pernas, enquanto pensava que o gerente do restaurante devia repensar aqueles lustres. Ela não era alta e a luz amarelada incomodava seus olhos. O penne até estava gostoso, mas devia ter pedido macarrão a putanesca, talvez tivesse mais sorte.
Mal havia terminado sua sobremesa, quando ele pediu a conta. Em uma das viagens, trouxera na mala um café árabe que “você precisa experimentar“. No apartamento dele, claro. Abriu a porta do grande sedan preto para que ela entrasse, sentou-se atrás do volante e atravessou a ponte para o outro lado do rio. Parou em frente a um grande prédio com piso de mármore e apertou o botão do elevador, direto a cobertura.
─ Antes do café, aceita um drink?
Jazz no home theater, um beijo, um quarto. Lençóis de cetim negro, luzes indiretas, mãos e abraços. Uma jacuzzi, outro Martini sem cereja e toalhas brancas. Um cigarro, outro beijo, uma taça quebrada no chão. Mais beijos, mais abraços, mais cetim e, finalmente, o sono.
Ela ficou a olhar o teto de gesso branco sobre sua cabeça, pesando os prós e contras da noite. Mais entediante do que muitas, melhor do que outras tantas. Ele era alto, chato, nada arrogante e generoso na cama. Um belo apartamento, mau gosto para sapatos e restaurantes, gostava de jazz e só tinha Martini ou vinho no bar. Olhos verdes invejáveis, mãos grandes e era fã de cinema europeu.
Assim, que ele a libertou de seus braços e do peso de sua perna, ela se levantou, pegou suas roupas e os sapatos. Foi até a cozinha e procurou pelo tal café árabe no armário. Uma caneca, o terraço e as luzes da cidade do lado de lá da ponte. Foi até o banheiro, olhou-se no espelho e reaplicou o eyeliner. Só, então, vestiu-se. Pensando em porque devia racionalizar o que deveria, apenas, sentir. Entrou no elevador.
Em cima do balcão, o bilhete ao lado da xícara.
Dear,
café delicioso, realmente.
Beijos,
M.
Publicado em sexta-feira, 5 05-03:00 novembro, 2010, em Sem categoria e marcado como contos, ela. Adicione o link aos favoritos. 3 Comentários.
Porra!!! O cara se esforçou…. quanta ironia. Se eu fosse o cara preferia que ela dissesse: que merda de noite!! E dp de transar ainda dormiu e roncou que nem um porco…. fala sério!!
hauahauaah.. mas o texto é bem engraça!! 😉
*engraçado!!
;D
Obrigada!